Fernando
Pessoa
Por trás
daquela janela
Por trás
daquela janela
Cuja cortina
não muda
Coloco a
visão daquela
Que a alma em
si mesma estuda
No desejo que
a revela.
Não tenho
falta de amor.
Quem me
queira não me falta.
Mas teria
outro sabor
Se isso fosse
interior
Àquela janela
alta.
Porquê? Se eu
soubesse, tinha
Tudo o que
desejo ter.
Amei outrora
a Rainha,
E há sempre
na alma minha
Um trono por
preencher.
Sempre que
posso sonhar,
Sempre que
não vejo, ponho
O trono nesse
lugar;
Além da
cortina é o lar,
Além da
janela o sonho.
Assim,
passando, entreteço
O artifício
do caminho
E um pouco de
mim me esqueço
Pois mais
nada à vida peço
Do que ser o
seu vizinho.
25-12-1930.
Poesias. Fernando
Pessoa. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa:
Ática, 1942 (15ª ed. 1995). (in Arquivo Pessoa, disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/148
)
Foto: Jornal Moliceiro